A concessão da Floresta Nacional
(Flona) do Crepori, em Itaituba, no sudoeste do Pará, pode ser suspensa pela
Justiça Federal, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), porque o
processo de licitação dos recursos florestais escondeu a existência de
populações tradicionais e indígenas vivendo no interior da área e utilizando a
floresta. De acordo com o MPF, há flagrantes irregularidades no plano de manejo
elaborado pelo Instituto Chico Mendes (ICMBio), gestor da Flona. O vencedor do
leilão foi a empresa Brasad'Oc Timber Comércio de Madeiras Ltda.
Quando o edital de licitação da
Flona do Crepori foi divulgado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) em maio
de 2013, o MPF identificou a irregularidade no plano de manejo, que mencionava
a existência de pelo menos 213 pessoas morando e utilizando os recursos da área
mas desconsiderava a presença de possível população tradicional e dos limites
entre a Flona e a Terra Indígena Sawre Muybu, dos Munduruku, em fase de
demarcação.
A partir da constatação das
irregularidades, o SFB recebeu recomendação para suspender o processo de
licitação, mas respondeu que não acataria a recomendação. O MPF solicitou
perícia sobre a população da área, coordenada pelo pesquisador Maurício Torres,
que já havia feito, a pedido do ICMBio, uma revisão populacional da área. A
revisão mostrava claramente a existência de população tradicional, mas foi
desconsiderada tanto pelo ICMBio (que não enviou o parecer), quanto pelo SFB.
A população ignorada seguidamente
pelo ICMBio e pelo SFB vive no rio das Tropas e, de acordo com a descrição do
perito Maurício Torres, trata-se de “garimpeiros que utilizam técnicas
artesanais de garimpagem manual, de baixo impacto ambiental e de alta
composição de saber patrimonial agregado”. “A população tradicional deve ser
identificada como beneficiária da unidade, com exceção de uma ocupação cujo
perfil não caracterizava uma posse legitimável à época da criação da UC
(unidade de conservação) que deve ser notificada para saída sem direitos
indenizatórios”, prossegue.
A perícia afirmou ao MPF que “o
projeto de concessão, tendo em vista a área licitada, impactaria as comunidades
encontradas, uma vez que a atividade madeireira em suas proximidades afetaria o
modo de vida local.” Mais do que isso, foi possível observar que a área de uso
direto e até de morada desses grupos figura dentro do perímetro a ser licitado
(…) o que tornaria impossível a permanência do grupo na área”.
“Há evidente ocupação do povo
Munduruku na área da Flona Crepori, sendo que tais áreas eram utilizadas em
conjunto pela comunidade e pelo povo Munduruku. O relatório conclui, ainda, que
no interior das áreas licitadas passam igarapés de pesca, trilhas de caça e
zonas de coleta. Ademais, há concentração de aldeias Munduruku na margem
esquerda do rio das Tropas, na divisa com a Flona, a menos de 2 km do megaempreendimento
madeireiro, chamando a atenção, ainda, para ausência de consulta ao povo
Munduruku e as demais comunidades tradicionais, na forma da Convenção 169 da
OIT”.
O MPF pediu que a Justiça
suspenda imediatamente a concessão da BrasaD'oc Timber para a realização de um
estudo antropológico complementar que caracterize judicialmente as populações
da área. Já são duas as concessões florestais do SFB que estão sendo
investigadas pelo MPF, recentemente, o leilão das Flonas de Itaituba I e II,
que também afeta os Munduruku e populações tradicionais, foi questionado.
O processo contra o leilão da
Flona do Crepori foi encaminhado pelo MPF à
Justiça Federal em Itaituba. (Fonte: MPF)
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